O desenho foi uma das primeiras formas de comunicação entre os homens. A arte rupestre, que data de 40.000 a.C., era a forma do homem pré-histórico registrar (ou seja, guardar para si e para seus descendentes) o seu mundo: animais como bisões e práticas como a dança estão entre os temais mais comuns gravados em paredes e tetos de cavernas espalhadas principalmente na Europa. Numa leitura mais aprofundada, podemos dizer que desenhar era dominar e possuir – se você consegue reproduzir, aquele objeto é seu, lhe pertence. (Esta mesma leitura também será empregada períodos mais tarde, quando o homem passou a dar nomes às coisas.)

Retrato pré-histórico da caça: desenhar era ter poder
Retrato pré-histórico da caça: desenhar era ter poder

Desde então, nunca mais deixamos de desenhar.

Milênios se passaram. No fim do século XIX, durante a efervescência da chamada Revolução Tecnológica, Émile Reynaud inventou um sistema de animação de desenhos. Seu praxinoscópio servia para projetar imagens em movimento na parede. A primeira exibição pública foi no Museu Grévin, Paris, em 28 de outubro de 1892, data tida por muitos como o nascimento do desenho animado. (Digo que “é tida por muitos” porque há quem credite o advento do desenho animado ao belga Joseph Plateau e ao austríaco Simon von Stampfer, inventores de brinquedos ópticos como o fenaquistiscópio.)

Então tivemos Émile Cohl com seu Fantasmagorie (primeiro desenho em projetor moderno, 1908); Quirino Cristiani com seu Él Apostol (primeiro longa em animação, 1917); Otto Messmer e Pat Sullivan com Feline Follies, que apresentou ao mundo o Gato Félix (primeiro desenho a ser transmitido em TV, 1919); Walt Disney com seu Steamboat Willie (primeiro desenho com som, 1928) e Flowers and Trees (primeiro desenho colorido, 1932).

Wikimedia Commons | Feline Follies, de 1919

Chega de fofura!

Gatinhos, ratinhos, tudo muito bonitinho… Mas não para todos os gostoso ou idades. Pensando nisso, algumas mentes sórdidas têm feito história com desenhos animados destinados a adultos. Cheios de piadas grosseiras, palavrões, putaria e violência, gente como Seth MacFarlane, Seth Green, Matthew Senreich, o pessoal da MAD TV, a galera do Adult Swim e tantos outros mudaram o paradigma do que é desenho animado para adultos: entre um exagero aqui e uma pitada de nonsense ali, eles perpassam alguns pontos bastante comuns da vida de “gente grande”.

Selecionei aqui os sete desenhos animados para adultos que fazem minha cabeça hoje em dia. O critério foi predileção, mesmo, e a ordenação é aleatória, sem que um seja melhor que o outro. Sugiro que você complemente a lista nos comentários, dizendo quais são os seus favoritos, quais eu esqueci, quais são os melhores episódios etc.

(Ah, tirei os grandes clássicos como The Simpsons e South Park, hors concours dentre os desenhos e presenças já garantidas no imaginário popular.)

É foda falar de desenhos animados para adultos (ou seja, escrotos por natureza) sem mencionar Drawn Together. Criação de Dave Jeser e Matt Silverstein, este desenho é como um reality show em que paródias de personagens de outras animações devem conviver enclausurados numa casa cheia de câmeras. Obsceno, não pega leve com escatologias e piadas baixas. Merecem destaque Spanky Ham (aqui no Brasil, Onanias), o porco viciado em sexo e estrume, Xandir P. Wifflebottom (em português, Xande), uma versão gay do Link, de A Lenda de Zelda, e a gostosíssima Foxxy Love (nome traduzido de maneira hedionda para Chica Ximbica), mulata cheia de trejeitos e com uma boca beeem suja.

7 melhores desenhos animados para adultos
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Durante um tempo, nas madrugadas, o Cartoon Network exibiu o Adult Swim, coletânea de animações para adultos. Uma pena que acabou, pois era bem foda. Uma dessas animações era The Boondocks, baseada na HQ de mesmo nome, de autoria de Aaron McGruder. Desta lista, The Boondocks talvez seja o desenho com mais nítida carga de crítica social, pois suas histórias são carregadas de sátiras de estereótipos. Os três membros da família Freeman (Huey, de 10 anos; Riley, de 8; e Robert, o avô) se mudaram recentemente para o subúrbio de Woodcrest, Illinois. Um lugar pacífico, ao contrário do lugar de onde vieram, onde a violência era cotidiana. Este é o choque cultural que serve de espinha dorsal ao desenho: eles devem se adaptar a esta nova vida, mas, para isso, devem deixar seus maneirismos de lado. Ah, não tente contar quantas vezes os personagens falam “nigga”, ou você vai acabar louco.

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Achei que todos conhecessem Family Guy. Mas enquanto pensava na lista de desenhos para colocar aqui e conversava com um amigo, descobri que nem todos sabem quem é a disfuncional família Griffin. O mais célebre desenho animado de Seth MacFarlane já ganhou três prêmios Emmy; pudera, é uma comédia hilária sobre o dia a dia de Peter (o pai burro e obeso), Lois (a mãe estilo dona-de-casa-que-tenta-corrigir-as-cagadas-do-marido), Chris (o filho tapado), Meg (a filha com baixa auto-estima e ignorada por todos), Stewie (o bebê genial que tenta matar a mãe e tem tendências homossexuais) e Brian (o cão falante, culto e alcoólatra). Os pontos altos deste desenho são os flashbacks nonsense e as músicas.

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Archer é uma paródia muito boa de James Bond. Sterling Archer é um agente secreto da ISIS (International Secret Intelligence Service) tal qual 007. Charmoso, tem alguns sérios problemas: é misógino, arrogante, estúpido como uma porta e sua chefe é sua mãe. Nunca consegue executar as missões corretamente. Muitas delas fazem referência direta à União Soviética – e não à Rússia –, o que torna difícil situar o tempo histórico em que as pataquadas do espião acontecem. (E, honestamente, a última coisa que Adam Reed, criador da série, deseja é ser correto.) Além de ter de lidar com bandidos, Sterling precisa lidar com sua ex, também agente da ISIS, e com os colegas de trabalho incompetentes.

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Mais um desenho que fazia parte do Adult Swim e do qual sou órfão. Sob o nome de Aqua Teen: O Esquadrão Força Total, esta animação é a mais “estranha” de todas desta lista. Afinal, seus protagonistas são um copo de milk shake egocêntrico e totalitário (Mestre Shake), uma almôndega ingênua de fala fina (Almôndega) e um pacote de batatas fritas inteligente e que solta raios pelos olhos (Batatão). Eu sei, parece um desenho zuado… E é! Esta é a graça. A animação é sobre coisa nenhuma – ou seja, não tem uma espinha dorsal que guie todos os episódios. Cada um é uma merda diferente da outra. Como as brigas entre o trio e o vizinho gordo e chato.

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  • Ugly Americans (VH1, quintas, às 21:00 e sextas, às 22:00; FX, vários dias e horários)

Imagine uma Nova York habitada não apenas por humanos, mas por monstros e criaturas demoníacas. Nesta cidade, o assistente social Mark Lilly tem o trabalho de ajudar lobisomens que não sabem fazer cocô no jornal, vampiros que querem largar o vício em sangue e caras que viraram mortos-vivos porque contraíram uma doença ao se relacionar com uma mulher. O desenho é repleto de humor mórbido, e cada episódio é mais grotesco que o anterior.

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Eu sei que não é exatamente um desenho animado, e sim stop motion… Ainda assim, a lista de animações para adultos seria incompleta sem Frango Robô, que passou no Brasil na época do Adult Swim, Frango Robô, de Seth Green, é feito de esquetes variadas (ora com bonequinhos no estilo Comandos em Ação, ora com massinha) em que o nonsense é a única coisa comum. Eles não perdoam comerciais, outros desenhos animados, filmes e demais produtos da cultura pop para avacalhar.

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E você? Que desenho fodão para adulto você indica para o PdH?

Nota do autor: Há outro post fantástico sobre animação aqui no PdH, escrito pelo Daniel Oshiro e voltado para animes (desenhos japoneses), chamado “8 animes fodões pra macho!“. Confira!

Rodolfo Viana

É jornalista. Torce para o Marília Atlético Clube. Gosta quando tira a carta “Conquiste 24 territórios à sua escolha, com pelo menos dois exércitos em cada”. Curte tocar Kenny G fazendo sons com a boca. Já fez brotar um pé de feijão de um pote com algodão. Tem 1,75 de miopia. Bebe para passar o tempo. [<a>Twitter</a> | <a href="http://www.facebook.com/rodolfoviana">Facebook</a>]"

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