Logo que mudei pra Campinas percebi que seria necessário fazer algo com o qual não estava acostumado: andar de ônibus. Na cidade de onde eu vinha, Botucatu, costumava fazer tudo a pé ou de carro. Mas aqui era diferente.
Na primeira vez que peguei o busão pra voltar do shopping, dei uma volta de duas longas horas – no começo massa, depois nem tanto. Foram raros os casos em algo estranho aconteceu. Na primeira agência que eu fui estagiário, pegava a linha 360, e agora em outra empresa, continuo na mesma linha.
De segunda a sexta, linha 360, sentido Castelo. Os minutos dentro de um busão costumam ser bem chatos e longos. Bom, longos eles sempre serão, mas a chatice dá licença quando algumas coisas acontecem lá dentro e você assiste a tudo de camarote por apenas R$ 2,50.
De todas as histórias, escolhi duas para contar.
“Seguinte, que tal todo mundo se segurar embaixo perto do banco? Meu nariz agradece.”
Primeira situação: “Você tá achando o quê?”
9h30 da manhã. Ônibus lotado, coisa que geralmente não acontece nesse horário. Todos sentados em seus lugares, os idosos nos bancos pra idosos, e um caboclo gordinho no banco pra obesos. E o resto se fodia em pé.
Eu lá no fundão, espremido, começo a escutar alguém falar mais pro meio. Pena que o “falar” se transformou com uma rapidez invejável em “gritar”.
“Porra, você fica encostando em mim!”
“Você tá achando o quê? Que eu sou viado, seu merda?!”
O resto não vai ser colocado aqui por bom senso.
Bom senso. Boa. Coisa que eles não tiveram, porque quando o busão inteiro notou que aquilo era uma discussão de verdade, eles já estavam nos tapas. Sim, nos tapas. Pareciam duas gazelas com atração a mil antes de acasalar brigando.
Uns riam alto, outros se continham, outros tentavam escapar dos tapas fora do alvo… Eu não fiz nada além de aumentar o volume do meu MP3 e pensar “Se for ver, R$ 2,50 não tá tão caro”. Camarote e uma briga das boas, bicho. Vale a pena.

Quase impagável – e de fácil leitura facial – foi a cara que as pessoas de mais idade fizeram de “Isso não acontecia na minha época, que horror!”, enquanto falavam “Gente, parem, vocês estão ficando loucos?”.
A briga nada saco-roxo teve duração de aproximadamente 30 segundos e foi interrompida com o cobrador passando seu cartão pela catraca (aqui, dependendo do ônibus, eles ficam à frente) e indo separar os dois.
Resultado foi que um se enfiou no fundão e o outro ficou lá pra frente, ambos contando suas versões da briga para as pessoas ao redor.
Segunda situação: “Zzz…”
Situação típica. Eu lá no fundão, dessa vez sentado, não espremido e sem MP3. Do meu lado, uma mulher com os seus 40 anos, de frente para o corredor.
Vejo que ela está dormindo. Até aí normal. Minutos se passam, ela não esboça avanço nenhuma sentido ao despertar. Sono profundo, braços segurando uma bolsa no colo.
O motorista olha pro fundo pelo retrovisor. Comenta algo com o cobrador. Olha de novo. E de novo. Comecei a ficar preocupado, verifiquei se estava com meu nariz no rosto, depois os dois olhos, a boca, as orelhas. Mas parecia que a coisa não era comigo.
E não era mesmo. Eu só fui me dar conta disso – eu e o busão inteiro – quando o filho duma… motorista freou de uma vez, na descida.
Resultado: uma daquelas cenas que eu, você e qualquer pessoa vai se lembrar para o resto da vida e contar numa mesa de bar ou então para os netos, engasgando de tanto dar risada.
A mulher do meu lado deu uma de tatu-bola e rolou toda desajeitada – a essa altura já bem acordada – até o meio do busão. Ponto. Acho que não preciso falar mais nada.
Agora, de brinde, mostro que nem só motorista de ônibus pode ser um imbecil. Piloto de avião também:
E você, meu velho? Já presenciou alguma cena no busão, trem ou metrô que vale a pena ser contada?
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