Todos os dias eu ando pela cidade.
Essa poderia ser uma ação fundamentada apenas na necessidade de me deslocar de um lado para o outro. Eu poderia simplesmente sair do ponto A e chegar ao ponto B, incólume, focado. Cumprir meu objetivo e seguir, cumprindo outros objetivos. Mas não.
No meio do caminho, eu penso. E crio jogos. Quando criança, os desafios eram mais diversificados e inocentes. Eu tentava acertar as linhas da calçada a cada passada, contava placas, homens, mulheres, carros de determinados tipos e assim por diante.
Até que chegou um certo ponto no qual superar meus próprios recordes e testar minha memória não era suficiente. Era preciso competir. Mais do que isso, era necessário vencer. Para tal coisa, eu precisava de um oponente.
A rua já foi palco de grandes duelos, em especial, no que diz respeito ao concurso de caminhada. Eu contra uma pessoa qualquer, andando lado a lado, um tentando ir mais rápido que o outro, rumo aos seus próprios compromissos, tentando provar, cada um à sua maneira, que sua preocupação e pressa são mais importantes. Tentando desesperadamente transformar todo o desconforto da competição em uma única coisa: a vitória.
Agora, achei esse vídeo que retrata esse estranho cacoete de entrar em jogos, em meio às tarefas mais triviais.
Talvez, seja todo esse cimento, a ausência de natureza, a urgência que nos é imposta. Quem sabe, são as propagandas, o excesso de barulho ou de poluição visual. Acho que algo nessa estrutura toda, construída para nos tornar mais eficientes esteja agindo sobre mim com tanto êxito que eu simplesmente não consigo fugir.
Na verdade, quando paro pra olhar com atenção, percebo que eu gosto de colocar a culpa na cidade. Só pode ser isso que me faz enlouquecer e agir dessa forma. É isso que me faz sentir tão pequeno, mimado e paranoico, ansioso por aceitação, por me reconhecer especial mesmo nesses micro-momentos.
No fundo, porém, não consigo negar, é de mim que todos esses pensamentos estão saindo.
publicado em 16 de Março de 2014, 20:18