No último final de semana, depois de 44 anos de jejum, o Manchester City foi campeão da Premier League. E com ares de crueldade.

O primo pobre dos diabos vermelhos perdia por 2 a 1 até os 45 minutos do segundo tempo. O resultado parcial dava o 20º título da história ao United. A torcida do City, que há muito tempo não via o time chegar tão próximo de levantar a taça, já dava o braço a torcer. Foi então que o futebol fez a sua graça.

Aos 46 minutos de jogo Dzeko empatou. E aos 49 o argentino Agüero fez o gol do título.

A comoção tomou conta do estádio. Torcedores, incrédulos, mal sabiam para onde correr. Houve invasão de campo, choro e outras reações naturais de quem torce para um time de futebol campeão.

Independente de como ele foi campeão.

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A história do Manchester City é bastante particular, mas cada vez mais comum. O clube viveu um século a sombra dos gigantes Manchester United e Arsenal. Seus grandes feitos foram competições esporádicas nas décadas de 30, 60 e 70, onde conquistou duas Copas da Liga Inglesa e dois campeonatos nacionais. Tirando isso, o City consolidou uma imagem de time azarado ao longo do tempo.

O crescimento dos rivais e o não aproveitamento dos enormes investimentos no futebol britânico dos anos 80 e 90 afundaram o clube na crise. Foram dois rebaixamentos e nenhum jogador convocado para a Copa do Mundo de 1998, um fato inédito desde 1970. Entre trocas de jogadores com o United e uma série de decisões erradas, o City manteve-se bastante instável até a chegada do ex-Primeiro-Ministro da Tailândia Thaksin Shinawatra, em 2006.

Aí a coisa começa a mudar de lado.

Shinawatra injetou muito dinheiro no clube. Logo no seu primeiro ano trouxe o ex-técnico da Inglaterra Sven-Göran Eriksson, o atacante italiano Rolando Bianchi e os primeiros brasileiros no clube: Elano e Geovanni. O clube começa a ganhar o destaque na mídia que não tinha desde 1970. Surgiram patrocínios, o dinheiro rodou e o City, enfim, teve um time competitivo depois da invenção da TV a cores.

Shinawatra, sempre bem acompanhado, assistindo jogo no Etihad Stadium

Essa nova era não teve impacto imediato. Após campanhas modestas – porém seguras – nas competições nacionais durante a gestão de Shinawatra, o City ganhou um novo presidente: Sulaiman Al-Fahim. O xeique comprou o clube e logo apresentou o cartão de visitas trazendo Mark Hughes e Robinho. O time voltou a se destacar pelo alto poder de investimento e causou uma enorme ciumeira dos adversários.

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Afinal, até onde os petrodólares podem ir para montar um time de futebol?

Essa pergunta até hoje ronda os clubes europeus que possuem investidores árabes e russos. Mesmo sem entender nada de futebol, eles têm dinheiro. Dinheiro e boas ideias. Jogadores são contratados aos baldes, mesmo não possuindo identificação nenhuma com o clube. Isso gera, automaticamente, preconceitos e acusações de compra de títulos e concorrência desleal. As “seleções informais” montadas pelo Manchester City servem até de motivação para adversários mais modestos, como (quem diria) Manchester United e Arsenal.

O City foi taxado como um time emergente de sorte.

Mas muitos se esqueceram de um importante detalhe:a torcida.

Manchester é azul

Quando o árbitro apitou o fim do jogo e consagrou o Manchester City como campeão da Premier League, uma comoção tomou conta da cidade. O clube voltava a ganhar uma taça depois de mais de quatro décadas. A reação daqueles torcedores, aqueles mesmos torcedores que lotaram o estádio nos tempos de vacas magras, comprova o tamanho deste time. O Manchester City não teve apenas a sorte de ter investimento para formar um time competitivo. Ele teve camisa.

Acusar o City de um clube aproveitador é de uma inocência absurda. Se hoje o City, assim como o Chelsea, tem elenco para disputar qualquer competição visando o título, é porque houve uma torcida o tempo todo que fez por merecer. Não se trata de técnicas de gestão ou como aplicar o senso comum dentro de uma tabela de projeção. Mas sim, de como, sabe-se lá como, a crença dos torcedores nos últimos anos teve efeito nas conquistas recentes.

Gosto de acreditar que a torcida não motiva pelos gritos. Mas sim, pela força de uma vontade que vai além da nossa explicação ou até mesmo compreensão. No futebol é assim. O Manchester City foi campeão porque no futebol é diferente. Em 3 minutos reescreveu 40 anos de jejum. E venceu.

A bola, senhores, não entra por acaso. Então não se surpreenda caso o Chelsea faça o crime neste sábado.

Nota do editor: o título do post trata-se de uma clara referência ao livro “A Bola Não Entra Por Acaso”, de Ferran Soriano. Leiam. 

Fred Fagundes

Fred Fagundes é gremista, gaúcho e bagual reprodutor. Já foi office boy, operador de CPD e diagramador de jornal. Considera futebol cultura. É maragato, jornalista e dono das melhores vagas em estacionamentos. Autor do <a>"Top10Basf"</a>. Twitter: <a href="http://twitter.com/fagundes">@fagundes</a>."