6.000 km, quatro Estados e um pedido de casamento | Na Estrada #10

Certas coisas nos chacoalham.

No final do ano passado, pedi minha então namorada em casamento. E publico esse relato somente agora pois hoje completamos um ano desde que a pedi em namoro. Pode soar bobo, mas é simbólico e algo que vou levar para o resto da vida.

Essa história começa na BR-101

Voltávamos de uma roadtrip eu, Barretta e o Guilherme – uma bela semana na virada de 2011 para 2012, na paradisíaca Praia do Rosa, em Florianópolis. Exaustos e de saco cheio com o engarrafamento interminável, fomos surpreendidos por um carro preto emparelhando conosco, na altura do quilômetro 56 da BR-101. Era um Classe-A, com três belas e sorridentes damas dentro.

Ruim pra mim, pois estava com a garganta inflamada, 38 °C de febre, dirigindo e com pouca atenção para as meninas. Já os guris ficaram atiçados, em especial com a loirinha que estava na direção. Improvisaram um avião de papel e jogaram no carro delas, com nosso número de telefone e uma mensagem(que é melhor nem contar aqui).

Boa manobra, pois voltamos pra SP e nos adicionamos no Facebook. Não dei sopa e logo comecei a manter longas conversas com a tal loirinha.

Em pouquíssimo tempo descobri a primeira coincidência: ela tinha morado por anos na minha cidade, Rio Grande–RS, situada a menos de 200 km do Uruguai. Praticamente a terceira cidade mais ao Sul do Brasil. E aí chega a segunda coincidência: ela era amigaça da minha prima.

Após alguns dias de papo, fomos ficando mais íntimos e combinamos que eu iria até Santa Catarina para nos conhecermos. Mais estrada. Logo na primeira noite em Itapema – onde nos vimos pela primeira vez, nos carros – propus um vinho à noite, na beira do mar. O encontro fluiu às mil maravilhas. Começamos a nos ver com certa frequência, quando ela vinha à São Paulo ou eu ia até ao Sul para visitá-la.

Como um romântico confesso, estipulei um prazo para, se tudo corresse bem, pedí-la em namoro. A data seria 4 de Março de 2012, no final de semana do casamento de um grande amigo, em Curitiba. A levei comigo nessa festa e durante o casamento tive a certeza de que ela era especial e que, mesmo morando longe, deveríamos apostar em algo sério, em incorporá-la à minha vida. Começamos a namorar neste dia.

Pegando a estrada rumo a Sampa, agora de mala e cuia

Em seguida, a convidei para morar comigo em São Paulo. Mais um passo importante.

Seis meses se passaram e posso afirmar: nunca havia me sentido tão feliz. Nesse tempo, consegui balancear a minha vida em vários sentidos – indo do profissional ao interno. Me tornei menos ansioso, mais centrado, mais calmo e mais conectado à família.

Comecei a pensar sobre o próximo passo: casamento. Estava decidido a pedir sua mão. Ponderei por cerca de 2 meses, avaliei os prós e os contras de se casar com trinta anos de idade – me colocando no centro da história – e senti que valia a pena. Não havia dúvida de que ela era uma mulher especial, daquelas que poucas vezes passam na nossa vida – se é que passam. Eu precisaria ser muito idiota e inseguro para querer continuar solteiro em busca de "alguém" que nem mesmo sabia quem era.

Toda essa ponderação me ajudou a entender o óbvio: não existe uma mulher perfeita. A idealização que nossa mente insiste em nos fazer buscar é coisa de filmes de Hollywood e historinhas da Disney.

Apostei que daria certo e planejei o ataque. Como poderia fazer um pedido de casamento autêntico, diferente e que fosse inesquecível para ambos?

De volta à BR-101: o pedido

Nunca fui fã de pedidos clássicos. Abordagens como declarações em restaurantes chiques da cidade ou um buquê de rosas com o anel dentro não me animam. Nesses momentos, vale colocar mais de nosso tempo e criatividade.

Era dezembro, época de festas. Bolei uma roadtrip até o Uruguai. Contatei a Audi e eles gentilmente me emprestaram uma verdadeira máquina. O “carro” era um Audi A6, 3.0 turbo, 6 cilindros, com quase 2 toneladas, novinho em folha. Várias vezes fomos parados em postos de gasolinas e afins com a frase: "Nossa, mas vocês estão bem de máquina, hein?"

A experiência de dirigir um carro desse nível é algo único. Durante meus 3 anos de PapodeHomem pilotei super esportivos de diversas potências, mas esse Audi foi um desbunde. Todos os amigos com os quais nos encontramos ao longo da viagem ficaram bobos com os recursos que o carro apresenta.

Saímos de São Paulo no dia dezessete, nunca vou me esquecer. Apaixonados, sozinhos, em um carro incrível, rumo ao extremo Sul do país. Sem data para voltar, sem destinos finais, sem grandes compromissos. Exceto pelo pedido de casamento.

Meu plano era recriar nosso primeiro encontro, à beira da praia. Passaríamos por Itapema no dia dezenove, completando exatos onze meses desde que estivemos lá sentados, bebericando vinho e nos apaixonando. Melhor momento não poderia haver.

Como programado, chegamos na região de Itapema ao final da tarde do dia dezenove. Para ela, celebraríamos os nossos onze meses no local que nos encontramos, repetindo o ritual. Para mim, eram dois meses de planejamento e nervosismo puro. Chegando à cidade, comprei duas garrafas de vinho, duas taças e nos dirigimos à praia, ao cair da noite.

Olhem, não sou um cara tímido. Sempre me expressei com facilidade, sendo bastante extrovertido. Mas nesse dia eu estava sem palavras.

O sol se pondo e eu bebendo quase uma garrafa inteira de vinho, buscando coragem. Aos poucos, os pensamentos começaram a fazer mais sentido e ganhei confiança. Comecei dizendo à ela que estava muito feliz com a forma com que as nossas vidas estavam se desenrolando, que estava feliz por nos darmos tão bem, com a leveza da nossa relação e a franqueza que conseguimos estabelecer mutuamente.

Ela me olhava atenta, em um misto de surpresa e cumplicidade. Palavras saiam da minha boca e eu só queria chegar no momento do pedido. Disse, por fim, que tinha trago um presente. Tirei a caixa do anel de minha mochila. Com os olhos repletos de lágrimas, olhei para ela:

Aceita se casar comigo, Larissa?

Não sei exatamente como ela recebeu a informação. Tudo o que sei é que desabou em choro, como se estivesse colocando para fora muito tempo de angústia e insegurança com relação às minhas intenções.

Após minutos que pareciam não ter fim, ela disse:

Sim, claro que eu aceito, seu bobo!

* * *

Depois disso, rodamos mais de 6.000 km durante 26 dias parando em diversas cidades em 4 estados brasileiros. Chegamos até o Chuí, extremo Sul do país, divisa com o Uruguai. Fartas risadas e momentos especiais com muitos amigos(isso por si só daria um outro texto Na estrada) fizeram dessa viagem uma aventura e tanto.

Para a turma dos pacotes turísticos com receio de pegar a estrada nas férias, digo apenas: aventurem-se. Peguem seus carros e metam o pé para desbravar cada estado e destino inexplorado aqui mesmo, em nosso país.

Gostaria de ler comentários e histórias sobre roteiros memoráveis vividos por vocês em viagens pelo Brasil.

Talvez sirvam de inspiração para aventuras futuras, agora como um homem casado.

* * *

Nota do editor: mandem seus relatos para as próximas edições do Na Estrada!

Após esse Na Estrada romântico, queremos mais histórias viscerais, com trilhas, escaladas, caminhadas, comidas exóticas, animais selvagens e tudo mais que vocês ousarem desbravar em suas expedições. Queremos inspirar vocês.

Instruções para envio:


  • O e-mail é naestrada@papodehomem.com.br

  • Faça um contexto rápido, contando quem estava lá, onde e quando foi a aventura

  • Escrevam textos curtos, concisos, contando o melhor, como se estivessem narrando os feitos para um amigo

  • Não esqueçam de ler as orientações para novos autores

  • Inclua as fotos mais descaralhantes da aventura; se tiver vídeo, mande também

Vamos sentir a qualidade e quantidade dos relatos para decidir a frequência da série. Relatos fracos serão negados, já avisamos pra ninguém ficar tristonho. Além do que, mais importante do que ter a história publicada na web é ter vivido tudo na pele.

Até breve!


publicado em 04 de Março de 2013, 11:20
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Felipe Ramos

Um realizador nato, de coração sem tamanho. Transformar pedra em banquetes é a especialidade desse MacGyver gaúcho. Notório por seu apetite festeiro, nunca recuse quando for convidado a uma de suas frequentes celebrações e aventuras. O imprevisível é seu prato favorito. No Twitter, @felipemktg.


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