5 razões pelas quais “Nem vem que não tem” do Wilson Simonal é a música mais malandrona do universo

1. A introdução

“Nem vem que não tem” possui a introdução de música mais absurdamente malandra da história da humanidade, superando qualquer coisa que o rap, o hip-hop, o pagode, o funk ou mesmo o canto gregoriano jamais pudessem alcançar. Não que a gente esperasse muito do canto gregoriano, claro.

Mas quando Simonal abre a canção com uma risada de clipe do Michael Jackson e já manda na cara da sociedade um “Vamos voltar à pilantragem... Xá comigo... uma musiquinha... pra machucar os corações...” você sabe que está diante de alguém que seria capaz de passar pela faixa de Gaza sem sujar um terno branco ou brincar de “Puxa meu dedo” num evento de final de ano da família Gracie. Foda, meus amigos.

Tente você, leitor, tirar uma foto assim e veja se consegue fugir do ridículo e manter a presença como Simonal.

2. O combo de metáforas

“Não vem com garfo que hoje é dia de sopa”, “Não vem de escada que o incêndio é no porão” e “Pra virar cinza minha brasa demora” representam possivelmente o mais complexo e genial combo de metáforas que a MPB já presenciou, mais ou menos como se Claudinho e Buchecha tivessem conseguido mandar três “Controlo o calendário sem utilizar as mãos” na mesma faixa do mesmo disco.

Eu sei o que ele queria dizer? Não, possivelmente não, mas malandragem é isso.

3. Wilson Simonal, pessoa física

Esqueça o lance da ditadura. Esqueça o lance do preconceito. Esqueça os filhos não tão legais assim. Simonal é malandro porque era um homem adulto que gravava um clipe cantando “Eu era neném, não tinha talco, mamãe passou açúcar em mim” e todo mundo achava legal.

Sim, cara, uma música que foi regravada pela Priscila da TV Colosso. Ganhe disso.

Link YouTube | Letra aqui.

4. A mensagem feminista

Eram os anos de chumbo. A ditadura militar baixou o AI-5, o AI-6 e o sarrafo, além de fazer com que meu pai (que fazia faculdade de história) sempre se assuste quando vê a capa daquele filme do Spielberg sobre o garoto-robô.

Enquanto Chico e Caetano falavam sobre a liberdade, a banda, o bêbado, o equilibrista, a alegria (alegria) ou que apesar de você amanhã há de ser outro dia, Simonal oferecia a todos uma lição atemporal e muito mais facilmente aproveitável: guarda seu lugar na fila porque homem que vacila a mulher passa pra trás. Ou você acha que o lance de “Quando eu penso na Bahia” vai te orientar em alguma coisa na vida, amigão?

5. O lance do sinteco

Esqueça as quatro razões anteriores. Você pode não se impressionar com a introdução malandra, com as metáforas crípticas e profundas, com a trajetória épica do artista ou mesmo com a visão brilhante de Simonal em termos de aconselhamento pessoal, mas uma coisa você não pode negar: precisa ser muito malandro pra cantar uma das duas únicas músicas já compostas em língua portuguesa que incluem em sua letra a palavra “Sinteco”.

Sim, amigo, existe apenas mais uma. E é do Dicró. Sério, onde está o seu Kanye West agora?


publicado em 02 de Outubro de 2010, 11:00
Selfie casa antiga

João Baldi Jr.

João Baldi Jr. é jornalista, roteirista iniciante e o cara que separa as brigas da turma do deixa disso. Gosta de pão de queijo, futebol, comédia romântica. Não gosta de falsidade, gente que fica parada na porta do metrô, quando molha a barra da calça na poça d'água. Escreve no (www.justwrapped.me/) e discute diariamente os grandes temas - pagode, flamengo, geopolítica contemporânea e modernidade líquida. No Twitter, é o (@joaoluisjr)


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