Pegamos 3 propostas de Bernie Sanders para os EUA e comparamos com o Brasil

O presidenciável se apresenta como um “socialista democrático” e tem quebrado tabus ao redor de sua campanha nos Estados Unidos

Um senhor com o cabelo bagunçado tem feito um verdadeiro furacão na política norte-americana nos últimos meses. Seu nome, Bernie Sanders, que até então era desconhecido por boa parte do público, já é sinônimo de resistência contra um sistema que tem colocado 1% da população no controle sobre os demais 99%.

Nas últimas semanas, Sanders tem conseguido crescer sua popularidade contra sua rival dentro das primárias do Partido Democrata para a eleição presidencial deste ano: Hillary Clinton, que menos de um ano atrás era considerada pela grande mídia norte-americana como a favorita e praticamente invencível candidata pelo Partido Democrata para o ano de 2016.

Senador, Sanders se considera um “socialista democrático”, que apesar de estar no Partido Democrata apresenta-se como independente. Durante toda sua vida política, fez o possível para construir uma nova ideia do que o socialismo pode proporcionar, utilizando como exemplo os países nórdicos como a Suécia e Dinamarca, nações que adotaram o modelo de bem-estar social após a segunda guerra mundial. Muitos críticos consideram que seu rótulo político não é propriamente verdadeiro — estando mais para social-democrata do que para socialista.

Mesmo assim, Sanders tem conseguido transformar o nome “socialismo” nos Estados Unidos, um país que historicamente perseguiu a ideologia marxista ao redor do mundo e dentro do próprio quintal. Uma verdadeira vitória já conquistada, influenciando uma nova geração que tem sido o suporte de sua campanha — os mais jovens, estudantes e trabalhadores com menos de 30 anos de idade. Sua maior plataforma não são vinhetas na televisão nem comícios em formato de espetáculo, e sim as redes sociais — o que tem sido considerado um tanto quanto irônico, já que se trata do democrata mais velho a disputar as primárias neste ano.

O Democratize decidiu pesquisar as três propostas principais desse novo “fenômeno” que tem sido Bernie Sanders. Mas não iremos debater como isso afetaria os Estados Unidos, e sim como estão sendo debatidas tais pautas dentro do Brasil. São temas polêmicos e que significariam uma grande mudança institucional nos EUA — mas e aqui?

1. Expansão do “Obamacare” com a criação de um sistema único de saúde público

Uma das propostas mais populares de Sanders é a criação do que seria um sistema de saúde público que pudesse fazer frente contra as empresas que fornecem convênio médico nos Estados Unidos, conhecidas pela forma gananciosa de atuação no país. Trata-se de uma expansão do “Obamacare”, que foi a tentativa do atual presidente democrata Barack Obama de fornecer um modelo de saúde pública para a população mais pobre no país, que não tem como arcar com centenas de dólares para bancar tratamento através da saúde privada.

No Brasil, esse modelo já existe: é o SUS.

Apesar de ser duramente criticado, o Sistema Único de Saúde brasileiro tem sido motivo de elogios internacionalmente. Instituído pela Constituição Federal de 1988, o modelo foi inspirado no National Health Service, do Reino Unido, e é universal.

Apesar de mais de 50% dos usuários do SUS terem dado notas negativas ao sistema segundo pesquisa do governo federal em 2014, trata-se de um desafio aprimorar e torná-lo melhor a ponto de que não seja necessário uma família com pouca renda ter que arcar com um convênio privado. O lobby de empresas privadas de saúde dificultam no Congresso e no Planalto uma reforma no SUS que torne isso possível. De qualquer forma, trata-se de um modelo de saúde pública que tem sido cada vez mais exigido nos Estados Unidos, principalmente por conta dos efeitos da crise econômica de 2008 no país até os dias de hoje.

2. Sistema educacional gratuito e universal

Os Estados Unidos é um dos países do mundo onde o estudante universitário adquiri maior dívida após encerrar seus estudos em alguma universidade do país. Pesquisas indicam que mais de 60% dos pós-graduados demoram cerca de 20 anos para quitar as dívidas.

A proposta de Bernie Sanders é tornar o ensino norte-americano gratuito e livre, começando por ampliando o modelo de universidade pública e gratuita ao redor do país — algo que, segundo ele mesmo, fazia parte da cultura norte-americana até os anos 80, utilizando como exemplo a Universidade da Califórnia.

No Brasil, existe um grande foco no ensino superior público, com universidades federais e estaduais espalhadas ao redor do país, estando sempre no topo da lista entre as melhores anualmente. Porém, existe um grande problema quando o assunto é integração social dentro dessas universidades públicas no Brasil. Para conseguir estudar em uma delas, existe grande concorrência e na maioria dos casos, quem se sai melhor são os alunos que estudaram a adolescência em colégios privados. Alguns programas federais de inclusão, além das cotas, tem facilitado um pouco mais o acesso de pessoas da classe C pra baixo nas universidades públicas do país, mas não o suficiente.

O ensino público no Brasil, do fundamental ao médio, ainda é de péssima qualidade, se formos analisar no aspecto geral. Comparado aos Estados Unidos, ainda falta uma estrutura mais eficiente para receber alunos e principalmente trabalhar com planejamento estudantil e de carreira, facilitando e encorajando o estudante a pensar no próximo passo — que seriam as universidades públicas.

Estudantes secundaristas de São Paulo e sua jornada de lutas por um ensino público de qualidade, durante as ocupações no final de 2015 contra o projeto de reorganização escolar | Foto: Reinaldo Meneguim/Democratize

3. Fim do financiamento privado de campanhas eleitorais nos Estados Unidos

Durante sua campanha, Bernie Sanders argumentou que a corrupção na política é vulnerável ao envolvimento de interesses privados. E utilizando este argumento, o senador socialista atingiu em cheio o seu maior rival: Wall Street.

Denunciando a forma como os grandes bancos financiam as campanhas eleitorais nos Estados Unidos — inclusive de sua concorrente, Hillary Clinton — Sanders defendeu que as campanhas eleitorais fossem de responsabilidade pública, acabando com qualquer tipo de envolvimento de interesses privados nas eleições.

Nos Estados Unidos existem gigantes pacotes de financiamento, chamados de PACs, que giram em torno de valores milionários e não costumam ter um único direcionamento — ou seja, empresas e empresários que financiam através de um PAC candidato X, pode fazer o mesmo para candidato Y.

No Brasil, o financiamento público e privado de campanha eleitoral entrou em pauta nos últimos anos, principalmente por conta das manifestações de junho de 2013, onde a pauta acabou surgindo nas ruas. Puxada posteriormente por muitos congressistas, principalmente do PSOL, a demanda pelo fim do financiamento privado continuou em Brasília.

Em setembro de 2015, a presidenta Dilma Rousseff vetou o artigo da minireforma política aprovada no Congresso que permitia o financiamento privado nas campanhas eleitorais. Segundo a nova lei nº 13.165, “ foi excluída a doação de pessoas jurídicas, agora o candidato a cargo eletivo fará, diretamente ou por intermédio de pessoa por ele designada, a administração financeira de sua campanha usando recursos repassados pelo partido, inclusive os relativos à cota do Fundo Partidário, recursos próprios ou doações de pessoas físicas, na forma estabelecida nesta Lei”.


publicado em 01 de Fevereiro de 2016, 00:05
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