16 filmes que mostram o lado humano surgindo no desespero da guerra

Os filmes que conseguiram explorar o lado real e humano por trás das máquinas de guerra. O campo de batalha é só o começo para os impactos nos seres humanos.

O ser humano é capaz de muitas coisas. Da atrocidade ao sentimento mais puro de solidariedade. 

O cinema, que está certamente entre as grandes invenções humanas, é mestre em explorar o melhor - e o pior - que há em você e em mim, mas também no seu vizinho, nos seus antepassados e até naqueles que ainda pisarão neste planeta verde e azul.

Há certamente uma lista maior de produções cinematográficas sobre conflitos armados e guerras que estão mais preocupados em apenas usar o orçamento, normalmente gigantesco, para explosões e bombas e aviões ultra-sônicos.

Aqui estão 16 filmes que vão justamente no caminho oposto. As películas que conseguem encontrar traços humanos em meio ao desastre.

O gerente Paul Rusesabagina, de Hotel Ruanda, na África, e o empresário Oskar Schindler, na Alemanha de Hitler, ambos com um senso mais puro de humanidade para salvar seus pares do genocídio, são os exemplos mais claros do que falaremos nas próximas linhas.

Bora lá?

1. O Resgate do Soldado Ryan

Era 1998 e praticamente impossível imaginar que um novo épico de guerra seria necessário ou conseguiria expandir as barreiras do gênero. Bem, aí surgiu Steven Spielberg para contar a história da equipe de resgate de Ryan (Matt Damon), soldado que perdeu outros três irmãos em combate na Segunda Guerra.

O preço da operação de resgate? A vida de outros oito soldados da equipe comandada pelo capitão John Miller (Tom Hanks). A vida de cada um deles valia menos que a de Ryan? Faz sentido estar no Dia D, na Normandia, para um resgate? E o soldados estavam prontos para uma missão dessas ou apenas para atirar contra quem vissem pela frente? Sobra filosofia e tensão. Tudo empacotado de uma forma jamais vista na telona.

Com o avanço da tecnologia, Spielberg entra de cabeça no front. Som, imagens, confrontos, tiros e explosões nunca foram tão reais. Resultado: Oscar de Melhor Filme e Melhor Direção.

2. Cartas de Iwo Jima

Em uma carta para sua esposa, o ex-padeiro Saigo, um dos soldados escavadores do front japonês, escreve: "Este é o buraco que vamos lutar e morrer". Quando ele foi recrutado pelas forças nipônicas, Saigo e sua esposa, que estava grávida, foram jogados na onda patriótica que repetia o quanto ele era "sortudo" por poder lutar por seu país. Surge daí uma narrativa sobre a honra, peça chave na cultura japonesa, lindamente construída por Clint Eastwood.

Iwo Jima tem o grande dom de mostrar os fatos sem jamais julgá-los. Assim, quando os soldados japoneses estão sem chances de vencer o poderoso armamento americano, a escolha pela morte é uma opção vista sem nenhum tabu. Eastwood mostra simpatia pelos soldados, a peça "descartável" no xadrez de uma guerra concebida por generais e políticos que jamais vão pisar num campo de batalha.

3. A Lista de Schindler

O filmaço de Steven Spielberg é um estudo de personagens em oposição na história. De um lado, um homem comum com algum senso de justiça. No outro, um burocrata forjado pela máquina nazista que surge como um psicopata. Oskar Schindler, engana clamorosamente o Terceiro Reich e protege 1,1 mil judeus do Holocausto, enquanto Amon Goeth quer ver a perseguição aos judeus tornar-se cada vez mais violenta. São personagens moldados pela guerra e que são convidados a fazerem escolhas.

A inocência é representada pela fantástica cena com a menina e seu casaco vermelho, um desbunde num filme em preto e branco. A personagem, aliás, foi inspirada na polonesa Roma Ligocka que frequentava um gueto judeu de Cracóvia. A atriz mirim Oliwia Dabrowska filmou a cena aos 3 anos e prometeu que não assistiria ao filme até os 18. A promessa foi rompida quando ela alcançou os 11 anos. Roma sobreviveu e tornou-se pintora.

4. Glória Feita de Sangue

O general Mireau ordena um ataque suicida e sem sentido a uma fortaleza alemã em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial. Após o evidente fiasco, três soldados são escolhidos para ser fuzilados por covardia.

Kirk Douglas, na pele do coronel Dax, tenta ser a clareza inexistente no conflito e na cegueira sanguinária de seus chefes. Indignado com a arrogância e incompetência de seus superiores, Dax tenta defender os inocentes.

As perturbadoras cenas de guerra, ainda bastante atuais, e a frieza e a crueldade das ordens e a tirania que nasce dentro das trincheiras falam por si. A primeira obra prima de Stanley Kubrick.

5. Além da Linha Vermelha

Um relato de três horas sobre a Batalha de Guadalcanal, entre as Forças Aliadas e o Império do Japão, durante a Guerra do Pacífico, em 1942. Mas, se é Terence Malick não é tão simples assim. O conflito é o ponto de partida para uma série de questões bem mais filosóficas. Talvez este seja o filme mais singular de guerra já produzido. É um filme religioso sobre a guerra? Um filme de guerra com toques transcendentais? Malick está tão interessado ​​na flora e na fauna do Pacífico quanto nos seres humanos. Diz o desertor Witt (Jim Caviezel): "O que é esta guerra no coração da natureza, por que a natureza compete consigo mesma?". O diretor, como de costume, gosta de colocar nos nossos olhos a pequenez da guerra. E a nossa também.

6. M*A*S*H*

Uma das razões da comédia de Robert Altman funcionar tão bem é transformar o campo de guerra em algo que ele efetivamente é: o  ridículo da humanidade. 

O clássico dos anos 1970 faz graça do desespero (quantas vezes você já não fez o mesmo?). Estão lá os médicos e enfermeiros numa base logo atrás das linhas de frente na Guerra da Coréia. Tudo encharcado de sangue, claro. Os cirurgiões trocam amenidades enquanto amputam pernas e amarram artérias, tentando tornar o trabalho mais complicado da vida em algo suportável.

E, finalmente, quando se veem fora da tenda de operações, é hora de tentar viver a vida com um pouquinho de sanidade. Ainda que com menos graça.

7. O Pianista

​Baseado na autobiografia de Wladyslaw Szpilman, um pianista que tocava Chopin em uma estação de rádio de Varsóvia quando as primeiras bombas alemãs caíram na Polônia.

A beleza aqui é a opção de Roman Polanski em retratar Szpilman como um sobrevivente, mas não um lutador ou um herói. É a trajetória de um homem que faz tudo o que pode para salvar a si mesmo, mas teria morrido sem enormes doses de sorte e a bondade e empatia de alguns não-judeus.

O próprio Polanski, um sobrevivente do Holocausto, chegou a dizer que ter sobrevivido não foi uma vitória, já que muitos que ele amava não tiveram a mesma sorte. Incluindo a mãe, morta nas câmaras de gás.

8. Nascido em 4 de Julho

Segunda peça na trilogia de Oliver Stone sobre o Vietnã. Baseado na história real da traumática trajetória de Ron Kovic, um retornado da guerra paraplégico e com estresse pós-traumático. Na Convenção Republicana de 1972, Kovic denuncia as condições em que vivem os veteranos americanos e vira alvo preferencial dos mais raivosos.

Da tragédia nasce umas das vozes mais críticas ao militarismo, alguém viveu a máquina de dentro para voltar cheio de energia no engajamento contrário aos conflitos armados. Desde pequeno, Kovic imaginava que combater era o melhor que poderia fazer pelo seu país. O que ele não sabia era que ser um cidadão atuante era muito mais inteligente e efetivo.

9. Império do Sol

Pouca coisa pode ser mais impactante do que uma criança cheia de esperança perdida numa guerra fora de seu continente. Christian Bale é Jim, um garoto inglês de família rica preso num China ocupada pelos japoneses pouco antes de a Segunda Guerra Mundial eclodir. E, bem, pouco se fala, mas o Japão construiu imensos campos de concentração no território chinês durante um dos períodos mais dramáticos da humanidade.

A relação com o soldado Bale (John Malkovich) é o respiro no meio disso tudo. A amizade deles é a grande responsável por fazer Jim desenvolver a imaginação e sua relação muito específica com os aviões mesmo quando bombardeios são mais constantes que se possa imaginar. Talvez o filme mais subestimado de toda filmografia de Spielberg.

10. Soldado Anônimo

“Eu nunca usei meu rifle”. O entediado sniper Tony Swofford (Jake Gyllenhaal) é o fio condutor do filme de Sam Mendes (de Beleza Americana, lembra?). Mas, vem cá, quem é que se alista para o combate? Em um trecho do filme, Swofford é sincero o suficiente: “Eu tinha 20 anos e era burro o bastante para assinar um contrato”.

Soldado Anônimo pega um personagem que está incapacitado de realizar o seu trabalho - no caso, ser uma máquina de matar - para falar sobre a solidão e como é violento estar longe de casa em uma guerra que não é sua. Não é obra do acaso o narrador do filme ser visto em cena com um livro de Albert Camus. É o existencialismo frente a frente com a possibilidade de passar a simplesmente não existir num ataque inimigo qualquer. Estar preparado para o pior e jamais acontecer nada.

11. Feliz Natal

Como diz o nome, era dia de Natal em 1914, com a Primeira Guerra Mundial. É aí que uma trégua extraoficial e não desejada pelos comandantes dos respectivos exércitos se desenha o impensável: franceses, alemães e ingleses deixam as armas de lado para cumprimentos e abrir os presentes que chegavam de casa.

A história nos conta que aconteceu uma partida de futebol entre os combatentes, aliás. No filme de Christian Carion, os personagens principais são um tenente francês, um padre escocês, um tenor alemão e uma soprano dinamarquesa. Todos acabam com o destino bem diferente do que poderiam imaginar.

12. O Grande Ditador

Charles Chaplin foi ator, diretor, roteirista e também autor de trilhas sonoras e o simbólico Carlitos, o Vagabundo. Nada disso, porém, é tão impressionante quanto Adenoid Hynkel, o "grande" ditador da fictícia Tomânia. Em 1940, com fascismo ainda longe de ser derrotado pelas Forças Aliadas - Hitler e Mussolini estavam no poder com intensa mão de ferro -, o ditador de Chaplin brinca com o globo terrestre, para, sem querer, estourá-lo. É daqui também que sai o discurso final arrebatador. Um dos maiores gênios da história da arte em plena forma. Obrigatório.

13. Platoon

As temporadas longe de casa nos horrores da guerra traumatizam quando não deixam gravíssimas sequelas nos movimentos, no corpo (ver Nascido em 4 de Julho) ou na mente. O cineasta Oliver Stone é um dos que teve a capacidade de voltar para a casa após a Guerra no Vietnã com cabeça suficiente para criar um dos grandes filmes do gênero. É ele quem escreveu o roteiro e dirigiu Platoon. Num dos primeiros grandes filmes de bilheteria sem maniqueísmo de grandes heróis e tenebrosos vilões, Stone nos apresenta o enorme embate psicológico entre os sargentos Barnes (Tom Berenger) e Elias (Willian Dafoe) e na forma que eles decidem enfrentar a vida - e os combates - numa inóspita Ásia tropical empobrecida e carente tudo. Barnes e Elias, são como um confronto entre uma máquina violenta e opressora e um combatente que luta para manter a mínima dignidade no absurdo da guerra. No meio disso tudo, está a saúde mental do combatente Chris (Charlie Sheen), o narrador do filme, em atuação impecável.

14. O Labirinto do Fauno

Guillermo Del Toro usa como pano de fundo a Guerra Civil espanhola para sua fábula (infantil?) e contorna tudo com toques de filmes lado B de terror e referências de clássicos como Mágico de Oz e Alice no País das Maravilhas. São os livros - e a fantasia - que tornam a vida de Ofelia possível.

Ela é enteada do capitão Vidal, um ativo e violento servidor da ditadura fascista do General Franco. Aos 10 anos, Ofelia é levada pela imaginação a se separar do imenso período de trevas que a Espanha se tornou na década de 1930,  com uma das guerras civis mais cruéis do século passado. E aí até o convite de um fauno - meio humano e meio bode - pouco confiável é mais atrativa que a violenta realidade humana.

15. Hotel Ruanda

Paul Rusesabagina felizmente existiu. O personagem interpretado por Don Cheadle é o grande momento humano no devastador Hotel Ruanda. Com um revólver em sua cabeça, o então gerente de hotel chega a receber a ordem para matar mulher, os quatro filhos, mas também empregos e vizinhos. Era Ruanda, no auge do extermínio étnico entre tutsis e hutus que ainda hoje - 20 anos após seu desenrolar - faz a África chorar sangue. É inimaginável e inspirador ver como a coragem de Paul prevalece entre um sem fim de corpos, corrupção, violência, desespero, miséria e total desinteresse das Nações Unidas.  

16. Bom dia, Vietnã

“I Get Around”, dos Beach Boys, como trilha sonora para uma das entradas do radialista Adrian Cronauer (Robin Willians) é uma das minhas mais antigas lembranças cinematográficas. E eu nem sei o motivo. É certo que minha mãe estava assistindo e eu dividia o sofá com ela. Bem, inevitável dizer que somente Willians seria capaz de criar um personagem tão distante da realidade como um apresentador que faz graça para a tropa americana no Vietnã.

E, por aí? Qual foi o filme de conflitos armados que tirou sua respiração - e um punhado de lágrimas - de você?

Mecenas: Até o Último Homem

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Durante a Segunda Guerra Mundial, em plena Batalha de Okinawa, uma das batalhas mais violentas e com mais baixas tanto para os EUA quanto para o Japão, Desmond Doss recusa-se a pegar em armas e matar pessoas.

Ainda assim, não só sai vivo como consegue salvar mais de 75 homens feridos no campo de batalha, tornando-se o primeiro opositor da Guerra a ser condecorado com uma Medalha de Honra.

Dirigido por Mel Gibson e com Andrew Garfield no papel principal, o filme que conta a história de Desmond Doss foi indicado a 12 BAFTAS, 3 Globos de Ouro e, agora, a 6 Oscars, incluindo melhor filme, direção e ator.

Até o Último Homem estreia dia 26 de janeiro nos cinemas.


publicado em 24 de Janeiro de 2017, 18:22
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Rafael Nardini

Torcedor de arquibancada, vegetariano e vive de escrever. Cobriu eleições, Olimpíadas e crê que Kendrick Lamar é o Bob Dylan da era 2010-2020.


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