O dia que meu pai chorou

Meu pai não é intelectual, filósofo, cientista ou antropólogo cultural. Não conhece as pirâmides do Egito ou a visão da Torre Eiffel. Jamais esteve na Tailândia, Holanda, Itália ou Lua.

Mas sabe das coisas.

Em 10 de agosto de 1994 eu conheci aquilo que se tornou uma das coisas mais importantes da minha vida: o estádio de futebol. Essa estréia nas arquibancadas foi no jogo de volta da final da Copa do Brasil. Com o empate no primeiro jogo, bastava ao Grêmio uma vitoria simples para conquista do segundo título da competição. A confiança fez meu pai, um frequentador assíduo de estádios nos anos 80, voltar ao Olímpico depois de quase três anos de ausência.

Chegamos por volta de duas horas antes do início do jogo. Pegamos os ingressos nas bilheterias sociais e adentramos o local jogo. Aos poucos a torcida tomava o lugar erguendo faixas e tremulando bandeiras. Meu pai, durante todo o caminho até a arquibancada, falava sobre os jogos que presenciou, como a final da Libertadores de 83 e um Grêmio 6 x 1 Flamengo em 1989. Eu, impressionado com as cores, sons e cheiros que exalavam pelo estádio, acompanhava as lições atentamente.

Foi quando chegamos à arquibancada que tudo aconteceu. Meu pai, por algum motivo que até então eu não compreendia, simplesmente empacou. Ele, segurando minha mão, olhava para o centro do gramado e parecia prestigiar aquele minuto como se fosse em solidão. Um silêncio que não existia tomou conta da cabeça dele. Calado e com um leve sorriso no rosto, permaneceu quase 20 segundo sem se mover.

Foi então que ouvi uma das mais lindas frases da minha vida.

Nada é mais bonito que um estádio de futebol.

Disse, já com os olhos vermelhos e por meio de uma voz rouca que disfarçava o choro.

Meu pai no seu habitat natural: churrasco, cerveja e novos amigos

Leia o trecho abaixo ouvindo: The Beatles – Golden Slumbers

Aquele momento tornou-se emblemático. Mais do que ser meu primeiro jogo no estádio de futebol, foi a primeira vez que eu e meu pai fizemos um programa juntos. Eu tinha 8 para 9 anos, claro que não percebi isso na hora. É somente hoje, analisando o tempo que passamos com nossos pais, que dou-me conta da falta de mais momentos exclusivos com o velho.

É algo que sinto falta. Talvez pela timidez de ambos, jamais trocamos alguma idéia como amigos. A nossa relação é restritamente familiar. Nos respeitamos, admiramos, policiamos e divertimos, mas existem dezenas de segredos entre nós. Segredos dos mais vexatórios e humilhantes. Fatos que, talvez, não revelamos com medo de ser uma decepção para o outro.

Nas poucas vezes que separei um tempo para o meu pai, mesmo que na hora tenha me irritado com sua teimosia ou manias, sempre tirei algo de bom. Pequei ao exagerar na distância com o passar dos anos e responsabilidade geradas. Pequei, principalmente, ao não valorizar os minutos a mais que ele pedia apenas para ter minha companhia.

Aquele choro em 1994, na arquibancada do Olímpico, faz todo sentido. Ele estava me apresentado um mundo novo. Minha mão não precisava mais de tanta proteção. Eu faria, enfim, meus próprios passos. Eu faço meus próprios passos. Mas não antes de lembrar o que aprendi. Não antes de planejar um programa diferente e só para nos dois, mesmo que a vergonha proporcione alguns minutos de silêncio.

Às vezes nem precisamos falar. Basta uma troca de olhares e um gol relembrado. Esse desejo perpetua.

Já a nossa vontade de ver o outro bem, involuntariamente, divide-se.

Concurso Cultural Nordweg

Uma Nordweg para você, outra para o seu pai e o melhor segundo domingo dos últimos tempos garantido

É claro que um passeio com o seu pai no segundo domingo de agosto vai ser animal.

Mas, porra, ele também merece um presente saco-roxo. E a nossa dica uma pasta ou mochila Nordweg. Uma das marcas preferidas e mais disputadas do QG, a Nordweg vai dar um produto para você, leitor PapodeHomem, e também para o seu pai. Para participar responda:

Qual programa você faria com o seu pai só para relembrar os bons e velhos momentos?

O autor da melhor resposta poderá escolher dois itens no site da Nordweg. É a oportunidade perfeita para você adquirir um modelo original Nordweg para você e outro para o coroa. Lembre-se de colocar nos comentários qual modelo de pasta ou mochila você gostaria de ganhar e qual é o perfeito para seu pai. O nome do vencedor será divulgado terça-feira (09.08).

Update

O vencedor do concurso cultural é o leitor Guilherme Casimiro.

Cara, toda vez que eu leio um post desse eu seguro o choro, puta que o pariu.

Dentre as diversas e inapreciáveis lições que o meu pai já me deu, e me dá, ele sempre me ensinou por meio do Jiu Jitsu princípios elementares pra qualquer homem.

Me ensinou a lidar com o fracasso e com o sucesso, me ensinou a respeito da superação, da humildade, da honra, do caráter e diversos outros valores que eu poderia ficar horas citando aqui, sem problema algum.

Colocaria um kimono e iria lá, sem dúvida alguma.

Parabéns, folk!

Obrigado a todos que participaram e até a próxima.


publicado em 04 de Agosto de 2011, 06:31
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Fred Fagundes

Fred Fagundes é gremista, gaúcho e bagual reprodutor. Já foi office boy, operador de CPD e diagramador de jornal. Considera futebol cultura. É maragato, jornalista e dono das melhores vagas em estacionamentos. Autor do "Top10Basf". Twitter: @fagundes.


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