Made in China

Se você for loiro de olhos azuis em um lugar onde o povo é tipicamente moreno, você vai chamar atenção. Se for mulato onde a maioria é branco, idem. Se você vende algo desejável e que ninguém mais tem, ótimo, um brinde à sua comissão. Se você vende o que ninguém quer, ou se todos vendem o que você oferece, você está lascado.

E assim você consegue simplificar grande parte das relações. É tudo oferta e demanda. Triste perceber que a regra também se aplica, com força, ao trabalho que somos capazes de executar.

Um especialista em SAP (plataforma de gestão empresarial integrada), na area de supply chain, dependendo da fase do projeto, chega a receber R$ 140,00 reais por hora. Trabalhando 8 horas por dia, 20 dias por mês, isso dá um salário mensal bruto de R$ 22.400,00. E ele é raro, e por isso pode cobrar quanto achar conveniente, além de escolher onde trabalhar. Demanda alta, oferta baixíssima.

Balconistas que trabalham em stands, bem populares nos corredores de shoppings, recebem em média R$ 700,00 por mês. Algo em torno de R$ 4,40 por hora. Muitos estão aptos a fazê-lo. O serviço é simples, a oferta é alta, a demanda nem tanto. Vida complicada.

Ao extremo do exemplo

Imagine um lugar com muita gente. Adicione ainda mais gente. Você provavelmente imaginou algo parecido com a China:

Acha seu apartamento pequeno, amigo?

Estamos falando de 1,3 bilhão de pessoas. É o dobro da população do continente europeu inteiro. Tudo se torna mais complicado e mais intenso. Com tanta gente, a China tornou-se um dos maiores fornecedores de mão de obra do mundo. É muita oferta. Videogames, televisões, cacarecos eletrônicos. Tudo é produzido lá. A oferta é gigantesca, o cenário é complexo e tem problemas sérios.

Na primeira semana desse ano, trezentos funcionários ameaçaram se atirar do prédio da Foxconn, empresa que fabrica diversos aparelhos eletrônicos de marcas famosíssimas que a maioria de nós utilizam regularmente, como o iPhone e o videogame Xbox, da gigante Microsoft. Segundo a reportagem do Estadão, os funcionários reinvindicaram um aumento, que foi negado pela empresa – que, por sua vez, ofereceu uma compensação financeira aos funcionários, caso se desligassem dos cargos. Muitos o fizeram, mas a Foxconn desistiu do acordo firmado.

A decepção foi grande, porém provavelmente será abafada nos próximos dias. O histórico, entretanto, é triste. Além da carga de trabalho de 11 horas diárias, os funcionários da Foxconn, segundo a mesma reportagem, recebem apenas um dolar por hora, bruto. Desse valor, ainda serão abatidos impostos.

Encarnando a visão capitalista, reconhece-se que o funcionário vale muito pouco para a empresa. Caso este não aceite o emprego, não faltará quem o aceite. Paradoxalmente, se explodirmos o cenário micro e a história desse empregado chinês, e pensarmos na importância da China para a economia mundial, o rumo da prosa mudaria.

Ao que tudo indica, em breve eles estarão ainda mais presentes no cenário mundial. Pontos positivos também podem ser potencialiazados em virtude da quantidade de gente, e disso eles entendem bem. A fórmula é bem simples e envolve, em suma, educação. Enquanto o Brasil forma aproximanda 50.000 engenheiros por ano, a China forma 650.000. A quantidade de mão de obra a ser disponibilizada ao mundo cresce significativamente a cada ano. Em breve, entrarão com tudo no outsourcing de TI, mercado hoje dominado pela Índia.

De bobos eles não têm nada. O mundo precisa deles, e eles sabem disso. Ou você acha que consegue viver sem?


publicado em 17 de Janeiro de 2012, 12:14
Eduardoamuri

Eduardo Amuri

Autor do livro Dinheiro Sem Medo. Se interessa por nossa relação com o dinheiro e busca entender como a inteligência financeira pode ser utilizada para transformar nossas vidas. Além dos projetos relacionados à finanças, cuida também da gestão dO lugar.


Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.

Sugestões de leitura