E se hoje o Sul fosse um outro país? – Parte 2

Na primeira parte, Rodrigo Almeida começou a falar da Guerra dos Farrapos. Leia a continuação...

Convicto da vitória, Bento Manuel foi surpreendido pela bravura dos homens de Bento Gonçalves que recusaram a rendição e partiram para o combate.

Após ver todos os ataques imperiais serem repelidos, Bento Manuel levanta a bandeira do parlamento e pede negociação. Concorda em permitir que os Farrapos voltem para suas casas contanto que entreguem a província. Bento Gonçalves aceita os termos, mas ao se render é covardemente preso pelo Presidente imperial da Província e levado até o Rio de Janeiro com seus comandantes.

No Rio, os oficiais farroupilhas organizam uma fuga, sendo que um amigo de Bento Gonçalves acaba entalado em uma janela. O comandante Farrapo decide ficar com o amigo enquanto seus importantes oficiais escapam e voltam para o front no sul. Transferido para a Bahia, Bento consegue finalmente fugir e retorna ao Rio Grande do Sul, onde é nomeado Presidente. O Império nomeia um novo Presidente imperial para o Província que caçava quaisquer simpatizantes de ideias republicanas.

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Muitos anos depois da Guerra dos Farrapos...

Bento Manuel fica insatisfeito com a atitude do novo Presidente. Em uma brilhante manobra militar,termina por prendê-lo e decide se juntar ao Exército Farroupilha. Com a ajuda do novo comandante, as forças gaúchas derrotam o enorme contingente na inexpugnável fortificação em Rio Pardo tornando-se uma real ameaça aos dois últimos grandes redutos imperiais em Porto Alegre e Rio Grande.

O prestígio dos ideais republicanos é tanto que cidades catarinenses decidem se aliar ao movimento, resultando em uma preocupação sem precedentes ao governo imperial. Revoltas separatistas ecoam pelo Império e o cresce clamor nacional pelo surgimento de um estado republicano.

Em seguida, Bento Gonçalves nomeia como comandante da Marinha Rio Grandense Giuseppe Garibaldi que, em uma das mais estranhas e ousadas manobras militares da história da Marinha, toma Laguna (SC) conquistando para os gaúchos uma saída para o mar, já que os portos de Rio Grande e Porto Alegre eram controlados pelo Império.

Lá, Garibaldi e Teixeira Nunes travariam várias batalhas até as forças republicanas serem dizimadas tendo apenas 50 soldados retornado ao Rio Grande do Sul de um total de 500.

O evento mudaria a história dos embates, que a partir deste momento contabilizariam inúmeras vitórias para os Imperiais. A instabilidade crescia pois os Farrapos não desistiam de suas posições e contra-atacavam em cada território perdido independente do número de baixas sofridas.

Em novembro de 1842, o ainda Barão de Caxias é nomeado Presidente imperial da Província, traz Bento Manuel de volta para seu lado o nomeando comandante militar e muda a estratégia contra os revoltosos. O Barão de Caxias usou sua inteligência e estratégia militar impecável para causar significativas perdas aos farrapos que aceitaram receber o General Osório para dialogar.

"Primeiro de tudo, somos brasileiros"

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David Canabarro

Levado até Caxias, o grande cavalariano farroupilha General Canabarro teria ouvido do comandante do Rei "que a revolução tendia a desaparecer pela falta de elementos para prosseguir". E Canabarro, de imediato, lhe respondeu:

"Engana-se, general. Ainda temos elementos próprios para sustentá-la por muito tempo. Se quiséssemos vencer a todo transe, poderíamos fazê-lo. Leia esta carta e se convencerá. Mas, note, que não aceitamos o concurso estrangeiro, porque primeiro de tudo, somos brasileiros e em caso algum admitimos o auxílio da castelhanada."

Tal carta referia-se a uma resposta do General Canabarro ao ditador argentino Rosas, que mandou emissários propondo aliança com o líder farroupilha:

“Senhor: o primeiro de vossos soldados que transpuser a fronteira fornecerá o sangue com que assinaremos a paz com os imperiais. Acima de nosso amor à República está nosso brio de brasileiros. Quisemos ontem a separação de nossa pátria; hoje, almejamos a sua integridade. Vossos homens, se ousarem invadir nosso país, encontrarão, ombro a ombro, os republicanos de Piratini e os monarquistas do Sr. Dom Pedro II.”

O armistício estava garantido.

"Sirvam nossas façanhas de modelo a toda a terra"

O Império propunha um cessar-fogo garantindo liberdade a todos os farrapos, incorporação dos oficias rio-grandenses ao Exército Imperial mantendo seus atuais postos, patentes e o principal: taxação do charque hermano. A ideia parecia promissora, mas o Exército Republicano aboliu a escravatura e soldados negros eram tratados como iguais entre os farroupilhas. O Exército Imperial não poderia admitir negros sendo incorporados às suas linhas de combatentes.

Em março de 1845, é assinado o Tratado do Poncho Verde dando fim a guerra, garantindo o direito de negros libertados pelos gaúchos ingressarem no Exército Imperial e permitindo aos rio grandenses escolherem seu Presidente de Província.

O valor do nobre Barão de Caxias e sua honra impecável para com os republicanos lhe garantiu uma indicação ao Senado pelos próprios farroupilhas, o título de Conde de Caxias e mais tarde a presidência da Província. Como na letra de Joaquim José Mendanha, o sul deixava um importante legado para a formação do atual estado brasileiro: "Sirvam nossas façanhas de modelo a toda a terra".

Hino do Rio Grande do Sul

Ainda em 1845 Dom Pedro II visitaria a Província gaúcha. Tamanha era a consistência da paz criada por Caxias, que o próprio Bento Gonçalves prometeu lealdade incondicional ao Império. Logo em seguida Canabarro e Bento Gonçalves lutariam ao lado de Osório e Marques de Souza na Guerra do Prata, consagrando mais uma vez a supremacia militar brasileira por meio de seu exército invicto, que agora garantia a independência do estado uruguaio e paraguaio.

A prestigiada e temida cavalaria gaúcha seria novamente decisiva na maior de todas as guerras já travadas na América Latina, a Guerra do Paraguai. Novamente, sob o comando de Duque de Caxias e Marechal Osório, o Marquês do Erval e patrono da cavalaria, as forças brasileiras derrotaram o Paraguai nos mais difíceis combates que o Brasil já travou.

A guerra – que resultou na perda de 90% da população paraguaia, incapacitando para sempre aquela potência hegemônica em ascensão – provou a lealdade dos lanceiros negros ao Brasil e a unidade político-territorial de nossa nação.

O Sul é meu país?

Os separatistas de hoje provavelmente deixaram de comparecer as aulas de história ou esqueceram que seus antepassados farroupilhas derramaram sangue para defender esse país. Deveriam ao menos ter lido o artigo ficcional no Zero Hora sobre a atual rural e politicamente insignificante república dos pampas separada do gigante brasileiro.

O Sul é sim meu país. Mas o nordeste também, assim como o norte, o sudeste, o centro-oeste...


publicado em 18 de Outubro de 2009, 13:39
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Rodrigo Almeida

Engenheiro, apaixonado pela vida e por qualquer coisa com um motor potente, nostálgico entusiasta de muitas daquelas boas coisas que já não mais se fazem como antigamente.


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