DJ conquista pelo estômago

Entendendo a trajetória, de trás pra frente.

Ao contrário do que muitos releases dizem por aí, eu nunca tive influências familiares com relação à música, nunca aprendi a tocar um instrumento, eu me adaptei a uma teoria. Entenda: DJ conquista pelo estômago.

DJ precisa ser músico?

“Prezado cliente, agradecemos o seu contato e aproveitamos a oportunidade para informar que a fábrica não está mais em atividade, portanto os pedidos de prensagem de discos não serão mais realizados pela Poly Som. Serão atendidos apenas os pedidos que já se encontram em andamento.” (trecho do livro Todo DJ Já Sambou, de Claudia Assef)

Bem-vindos a era digital. Aqui, termos como interface amigável, facilidade de uso e portabilidade estão na moda. A era onde todos os dias DJs aspirantes surgem ao estrelato e carregam a vida no laptop, quando começamos a nos preocupar menos com a qualidade do som mostrado ao público e tentamos incessantemente ser mais um na cena. Está me olhando torto por quê? Sim, você é mais um...

Olha que bizarro, antigamente, num reino não tão distante, o DJ era simplesmente o que mamãe faz hoje quando troca o CD do rádio do carro enquanto viajamos: um trocador de discos. Hoje é protagonista. Legal, mas quantos DJs realmente entendem de música?

A teoria é simples: enquanto todos vão ao encontro ao futuro, eu volto na história dos nossos ancestrais disc-jóqueis e da cultura da música eletrônica. E, pense bem, esta também é uma maneira de entender o que virá no futuro, estudar a trajetória faz parte do percurso, entender as origens é essencial, saber sobre teoria musical é importante mas não é algo que nos impedirá de atuarmos na cena – essa nova geração de DJs acaba aprendendo a mixar pelos olhos.

De maneira alguma subestimo o surgimento das tecnologias para DJs, sou apaixonada por elas, afinal a história não para, mas não seja bobo prestando atenção somente nas cores da onda da música, o sentimento, o tão falado “feeling” se perde e você vira um robozinho atrás de um computador.

Ah... Homens criando máquinas, máquinas substituindo homens. O ser humano, como produto de um determinismo, no caso determinismo mecânico, reduz toda a discussão acerca do homem excluindo qualquer caráter valorativo. Eu já vi essa história, tudo bem, cyborgs... Ouch, um problema de cada vez.

Pensando bem, um robô agitaria mais do que muito DJ por aí.

A experiência como DJ nos faz entender sobre os sentimentos da pista: expressar-se através da música não é clichê, é fantástico. Não existem regras; ouvir e conseguir separar os elementos da música é o primeiro grande passo. Escute a linha de baixo e saberá o momento da virada perfeita, preste atenção na frase que se repete, observe como o reverb da caixa se estende até o próximo clap, conheça a música e saberá criar um momento “hands up”.

Observe a pista e observe mais ainda se alguém ali no meio está de braços cruzados, se sim ótimo, esse é o cara que está realmente criando um conceito sobre você e o seu trabalho, possivelmente aquele que vai te contratar para outros. Lembre-se que, literalmente, você está manipulando o sentimento das pessoas, o deslize é não perceber que o contrário também acontece. A pista tem o poder sobre a sua criatividade. As ferramentas mais importantes são o cérebro e os sentidos. Ser ansioso é péssimo para os nossos investimentos.

Facebook, Soundcloud, Twitter, Orkut, Myspace, Beatport, Juno, Serato, Traktor, agências, Mixmag, Dj Sound, Goma, blogs, Skol Beats, jornalistas, promoters, raves, selos, gigs, ecstasy, trance, trance, trance!

Com o rápido avanço dessa cultura as pessoas envolvidas se viram na necessidade de buscar novos modelos para um mercado sempre em mutação e ao mesmo tempo tão controverso. DJ não tem um caminho certo para começar, nem meio nem fim, cada um tem a sua história, métricas pessoais para o sucesso. Tracemos um gráfico, o grande problema não é chegar lá em cima, é manter-se lá.

A grande atuação é fazer algo que envelheça com o público, como as grandes bandas de rock, nunca esquecidas.

Respondemos, então, a polêmica pergunta: DJ precisa, sim, entender sobre musica, não basta ser apaixonado por ela – ora, quem não tem paixão por musica? Se apenas ama, ouça, colecione, compre. Se quer trabalhar com música, porém, amar é pouco. Acredito mesmo que esta seja a real essência, deixar-se levar pela intuição, ter cultura musical livre de preconceitos e, nessa incansável corrida, parar de reclamar da cena prostituída e agir.

Estilos de música eletrônica

Explicar qualquer estilo musical não é algo muito fácil. Gêneros e subgêneros vão surgindo como água em dia de chuva e normalmente ninguém sabe de onde veio. Mas um pessoal, e do Brasil, apareceu para explicar de uma forma bem tecnológica o complexo mapa da música eletrônica.

Link YouTube

Conheci a brincadeira ano passado quando fui visitar o FILE - Festival Internacional de Linguagem Eletrônica. Trata-se de um quadro interativo master-crazy-be-good onde três pessoas podem jogar simultaneamente com um controle de Wii para criar fusões de estilos e gêneros. Pude explorar brincando o universo da música eletrônica de uma forma como nunca ninguém me explicara antes.

É essencial conhecer a evolução, saber quem foram os artistas precursores de cada estilo, ter conhecimento para falar sobre algo que escolheu viver. Entender que o que chamamos hoje de música de pista originou-se de ruídos, sons ambientes, barulhos industriais. Há 62 anos acontecia um dos primeiros eventos da cena eletrônica, o Concerto de Bruits, divulgado pelo francês Pierre Schaeffer, você sabia que tudo começou aí? Será que Schaffer está para a musica eletrônica assim como Elvis está para o rock? Talvez...

Se liga nesse guia, uma forma prática e divertida de observar essa evolução.

Sem tal conhecimento, muitos DJs (mesmos os famosos) fazem mixagens impecáveis mas erram na estratégia de manipulação emocional do público. Fato: o controle da pista se reduz se o DJ se sujeitar a tocar para públicos incompatíveis com a sua personalidade musical, o que depende exclusivamente de bom senso, coerência, visão comercial e também da competência de promoters, produtores e empresários, ou seja, da indústria por trás que faz a noite acontecer.

Caro amigo DJ, como cantou a bela Ellen Allien ("Life is so easy"), você possui todas as ferramentas. Trabalhe a sua criatividade, só não se esqueça que você ainda é apenas mais um. Então seja inteligente, entre pela porta da frente, use e abuse da troca de informações, explore. No começo, leve como um hobby, tenha outra fonte de renda, agregue ao seu set ferramentas que ajudarão a criar um diferencial para conseguir sobreviver apenas tocando. Esse é o seu sonho, não?

Link YouTube | edIT, pra quem não conhece. Recomendo!

A musica eletrônica, em seu processo final de criação, quando bem elaborada, com qualidade e uma boa master, transforma-se em um belo portal de ativação, atinge os nossos ouvidos e nos faz sentir no estômago o que chamamos de punch. A força vibracional então espalha-se pelo corpo e conquista nossa alma.

Musica eletrônica é isso: é não só a liberdade de criação, mas de interpretação também. Esqueça os rótulos e divirta-se! O verdadeiro valor que um DJ deve ter vai muito alem do preço do cachê, acredite.

Pra finalizar, um clássico TOP 10.

10 dicas para um set perfeito

1. Faça uma mixagem harmônica (dica: www.mixedinkey.com).

2. Toque no máximo 3 minutos de cada musica: faixas muito extensas causam tédio; mixagens muito rápidas irritam.

3. Foque em um estilo, mas não se prenda a ele – construa o set progressivamente.

4. Esqueça que inventaram a função "sync automático" em equipamentos.

5. Esteja ligado nas novidades, mas conheça os antepassados.

6. Toque aquilo que gosta.

7. Conte os compassos.

8. Se errar, finja que não percebeu e conserte rápido, claro. O público raramente percebe.

9. Não toque muito louco, pois aí nem mesmo você perceberá as mancadas.

10. E por último, caso aperte o "stop" sem querer, interrompendo a vibe, grite: "É hora do parabéns galeraaaaaaa!". No mínimo será engraçado.


publicado em 03 de Setembro de 2010, 11:22
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Mallory Knox

DJ representante oficial da Numark no Brasil. Traficante de música boa, palestrante formada em Produção de Música Eletrônica, apaixonada por pessoas e seus sotaques, por lugares e suas culturas, por Berlin e suas referências. Possui um fascismo inegável por bizarrices e acredita que somos meras poeiras no planeta. Vegetariana por dissipação e defensora do minimalismo anti-social. Ahn?! Também no Twitter e no Soundcloud.


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