Você não presta! E agora? A psicologia de lidar com a crítica

Sugerimos três úteis atalhos a serem praticados, que podem te ajudar a preservar sua sanidade e suas relações

Estranho o poder que críticas possuem pra mexer com nosso senso de identidade, não? Às vezes, lendo alguns comentários mais ácidos aqui no PdH, nos lembramos desse quadro no qual pessoas lêem xingamentos recebidos via Twitter. Todos temos dias ruins, é compreensível que certas coisas sejam ditas sem pensamento elaborado por trás.

 

No devido contexto, é fácil dar risada e levar numa boa. Mas acertar a mão entre o que dispensar como piada e o que levar a sério, como feedback útil, não é nada fácil. E indo além, como de fato manter nosso espírito em paz, sem nos autoflagelar excessivamente?

Tendo a pensar que uma pista está nos estudos da Kristin Neff sobre autocompaixão (aqui a toca do coelho), que constantemente menciono por aqui.

Entretanto, vejo valor também em abordagens como a da Kayla Matthews, publicada no excelente blog Crew. Tomamos a liberdade de, sob gentil autorização da autora, traduzir e compartilhar na íntegra com vocês por aqui.

Boa leitura nesse domingo!

* * *

"Você não presta! E agora? A psicologia de lidar com a crítica", por Kayla Matthew

Ninguém gosta de ouvir que não é nada bom em alguma coisa. Porém, não importa como isso é colocado em palavras, é isso que ouvimos quando somos criticados.

Nem todos lidam com a crítica do mesmo modo.

Já reparou na capacidade de nossa mente, que nos acompanha 24 horas por dia, nos tratar como inimigos?

Algumas pessoas recebem a crítica muito bem, e a utilizam para melhorar seu trabalho, enquanto que outros se sentem totalmente esmagados por um mísero feedback ligeiramente crítico. Para mim mesma, receber qualquer tipo de crítica em público provavelmente acaba em suor e rubor na face (que não são as respostas mais adequadas a uma dama, eu bem sei).

O legal de trabalhar principalmente em casa é que não é comum que eu tenha que exibir essa reação em público. Ainda assim, já passei pela experiência de muitos editores serem bem rudes ao destruírem minhas sugestões de tópico e minhas ideias para artigos, e isso pode ser igualmente frustrante e embaraçoso.

Não obstante o fato de você ser capaz de lidar bem com a crítica, estudos mostram que ser criticado deixa a maioria de nós sentindo-se mal a respeito de si próprio, e pode até mesmo prejudicar a produtividade, na medida em que nossos cérebros passam a devotar energia demais no esforço de lidar com a crítica, ao ponto de tornar difícil nos focarmos em outras coisas.

Como seu cérebro processa a crítica

De acordo com o Dr. Martin Paulus, Professor Adjunto de Psiquiatria na Universidade da Califórnia, San Diego, há duas partes de nosso cérebro ditando como processamos emocionalmente a crítica e respondemos a ela: a amígdala e o córtex medial pré-frontal.

A amígdala determina o que tomamos como importante e tem um papel chave na formação de nossas memórias emocionais, enquanto que o córtex medial pré-frontal regula como reagimos aos estímulos emocionais (tais como a crítica).

A amígdala também tem um papel enorme em nossa resposta de luta ou fuga, e é por isso que receber notícias ruins como a crítica pode algumas vezes parecer realmente ameaçador. Um comentário negativo do chefe certamente não vai nos matar, mas pode nos fazer sentir que nossa carreira e ganha-pão estão em perigo.

E estes eventos ficam conosco. Nossa consciência aguda das coisas que podem nos prejudicar é chamada de viés da negatividade – e é por isso que comentários e experiências desagradáveis grudam em nós com muito mais força do que os agradáveis.

Enquanto que se sentir mal com a crítica é totalmente natural e inevitável, deixar que ela acabe conosco pode ser extremamente prejudicial a nossa produtividade, bem como a nossa felicidade de modo geral.

Como pessoas diferentes lidam com a crítica

Apesar das tendências evolucionárias que nos levam a nos sentirmos um tanto ameaçados pela crítica, cada um de nós lida com ela de forma diferente.

Aqui seguem algumas das formas mais comuns das pessoas lidarem com a crítica:

- o internalizador

Algumas pessoas parecem aceitar muito bem a crítica, mas apenas na superfície, por dentro estão se digladiando. Este tipo de resposta à crítica é caracterizado por mentalmente se menosprezar e ser duro demais consigo mesmo.

- o autoconvencedor

Semelhantemente ao internalizador, o autoconvencedor assume o feedback negativo muito pessoalmente. Porém, em vez de culpar a si mesmo, ele joga a culpa sobre os outros, até mesmo verbalmente. É possível que não use palavras agressivas, mas irá desafiar e mesmo argumentar contra afirmações negativas como um meio de convencer a si mesmo e ao crítico que a crítica é injusta.

- o defensor

É natural nos defendermos de ameaças externas, inclusive da crítica. Defensores exibem uma reação suave, ainda que um tanto defensiva, ao feedback negativo. Porém, não perdem o sono por causa da crítica, e não contra-argumentam com o chefe o que podia ter ido melhor no último trimestre. Provavelmente acha que o crítico está um tanto enganado, mas até aí tudo bem.

- o que busca por feedback

Lidar com a crítica dessa forma significa ativamente buscar entender a critica. Ele pode se sentir mal com os comentários, mas não está se flagelando, e não está jogando a culpa pelas ações criticadas na pessoa que critica. Aqui simplesmente se quer saber por que o crítico pensa do jeito que pensa, e o que se poderia fazer para mudar sua perspectiva.

Como lidar melhor com a crítica

Há dias bons e dias ruins, normal.

Embora seja improvável que um indivíduo se encaixe perfeitamente nesses perfis, verificar qual deles melhor descreve você é uma boa ferramenta para avaliar como melhor lidar com a crítica.

Em meu próprio caso, quase sempre caio mais no perfil “internalizador”, muito embora eu não seja tão boa em disfarçar que fico afetada por comentários críticos. Sabendo disso, posso entender que definitivamente há o que melhorar em minha estratégia de lidar com a crítica, e assim posso usar as dicas abaixo para esse fim.

1. Separe a crítica de si mesmo

Muitas pessoas tomam a crítica de forma mais pessoal que necessário, e é aí que se dão mal. O Dr. Paulus diz que é importante separar a crítica de nosso senso de individualidade. O melhor é não ver a crítica como algo sobre o que somos como pessoa, mas como um simples feedback sobre uma única ação, um evento específico ou situação particular.

“Por exemplo,” diz ele, “se uma pessoa diz ‘este artigo está mal escrito’ então o aspecto importante é não encarar isso como uma crítica sobre a pessoa que escreveu o artigo, mas como uma crítica quanto próprio artigo.   

Dado que até os maiores escritores podem escrever artigos ruins, isso dissocia o forte senso de autoflagelo que geralmente ocorre com a crítica, e também facilita uma possível resposta à crítica.”

Se você puder aprender a encarar a crítica como um feedback sobre algo que você fez e não um feedback sobre quem você é, talvez você seja capaz de começar a tomar as críticas de modo menos pessoal e seguir o dia sem problemas.

2. Faça perguntas em aberto

Fazer perguntas a quem o critica é importante porque não só mostra a eles que se está ouvindo, mas porque permite aprender mais sobre por que viram a ação ou evento do jeito que viram.

Fazer perguntas em aberto é a melhor forma de obter essa informação. Perguntas simples de “sim” ou “não” mostram que você está ouvindo, mas não que está ativamente buscando um feedback.

Faça perguntas do tipo “Como você acharia melhor eu lidar com essa situação da próxima vez?” ou “Você poderia dar um exemplo de como eu poderia lidar com isso no futuro?”

Assim você facilitará um discurso mais aberto e profissional com seu crítico, e talvez vocês possam, quem sabe, terminar a conversa de bem um com o outro.

3. Não encare os erros como completamente ruins

Sei que soa loucura, mas os erros não são tão ruins. É verdade, algumas vezes eles podem resultar em problemas como desperdiçar seu tempo, ou o que parece ser um golpe na sua reputação, mas nosso encarar subjetivo de tais eventos é tudo que determina o quanto vão ser ruins.

Em vez de nos sentirmos mal com os erros e as críticas que podem surgir deles, os aceite e os encare como uma oportunidade de aprendizado.

Um jeito que encontrei para fazer isso foi, ao longo dos anos, pensar coisas como, “Bem, melhor aprender isso agora do que mais tarde”, ou “Agora já passou, está resolvido, posso melhorar da próxima vez”.

Se você não ficar chateado pelas críticas e erros, você se sentirá mais positivo e estará mais preparado para lidar com situações parecidas no futuro.

* * *

Creio que todos podem dizer que a crítica teve seu papel em formar quem somos – de nossos pais nos criticando enquanto crianças até nossos colegas agora como adultos.

Em minha carreira como escritora aprendi que para comentário negativo há um positivo, para cada troll nos comentários, há um leitor realmente prestando atenção, e para cada má sorte que se apresenta, há um pouco de boa sorte.

Só não podemos deixar a negatividade nos derrubar.

E vocês, como têm lidado com as críticas?


publicado em 04 de Outubro de 2015, 15:53
File

Guilherme Nascimento Valadares

Editor-chefe do PapodeHomem, co-fundador d'o lugar. Membro do Comitê #ElesporElas, da ONU Mulheres. Professor do programa CEB (Cultivating Emotional Balance). Oferece cursos de equilíbrio emocional.


Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.

Sugestões de leitura